Duna (1984) x Duna (2021)

Leonardo Melo
4 min readOct 29, 2021

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Adaptar um dos romances sci-fi mais clássicos de todos os tempos não é tarefa fácil. Quais as diferenças e similaridades entre as duas principais tentativas já produzidas? *** Texto com SPOILERS ***

Preciso começar dizendo que eu acho que o Duna de 1984, apesar de tosco, cumpre seu papel de contar a jornada de Paul Atreides. Contudo, tudo se dá de forma bem acelerada, afinal o livro original é gigantesco e a proposta era contar a história toda em uma película de pouco mais de duas horas. Além disso, acredito que o filme acabe sendo uma vítima de seu tempo, com vilões caricatos e bobos, muito embora os efeitos, para a época, sejam espetaculares.

Não li o livro, mas tenho a impressão que David Lynch quis imprimir sua visão sobre a obra de Frank Herbert, o que acabou deixando o filme meio enfadonho. Já na nova versão, apesar da história ser essencialmente a mesma (não tem muito como mudar, certo?), tudo é mais grandioso e mais bem trabalhado, não só por conta da disparidade da tecnologia (afinal, são quase 4 décadas que separam um filme do outro), mas por conta de um cuidado maior nos detalhes, já que não havia a preocupação de contar tudo em 2 horas.

Talvez por isso mesmo alguns espectadores achem o filme meio arrastado. Quase não temos ação, mas nem por isso o filme é chato, pois os personagens estão sendo trabalhados e você sabe que alguma coisa épica está para acontecer. Não é para menos, pois quando a ação finalmente explode, é algo de cair o queixo, como há tempos não se via na telona.

Tudo que acontece em 70% do filme original está apresentado no novo filme. Conhecemos Paul Atreides, herdeiro da casa Atreides, inimiga mortal dos Harkonen. Sabemos da profecia que fala de um messias que libertará o planeta Arrakis, também conhecido como Duna. Ele, seus pais e seu melhor amigo são enviados a esse planeta a mando do imperador, sem saberem que estão rumando para uma cilada.

Vemos uma primeira tentativa de assassinar Paul, com um robô autômato na forma de um inseto com uma agulha envenenada, exatamente como no original. Também temos um primeiro vislumbre dos vermes da areia, quando um deles ataca uma máquina que refina a especiaria, e acaba sendo engolida pelo monstro. Conhecemos os escudos de combate, infinitamente melhores agora em 2021 do que a versão poligonal e desengonçada de 1984. E a cena em que um colega se surpreende com a habilidade de Paul de vestir corretamente o traje do deserto é praticamente idêntica nos dois filmes.

Há o golpe contra a casa Atreides, no qual um traidor entrega o pai de Paul, mas não sem antes trocar um de seus dentes por uma cápsula envenenada, numa tentativa desesperada de matar o Barão Harkonen. Apesar dele conseguir matar alguns de seus asseclas, o barão escapa. Personagem, aliás, muito melhorado em relação ao filme original, bem como seus capangas, que de capachos caricatos, passaram a guerreiros de verdade.

Paul então escapa com sua mãe para encontrar o povo do deserto, os Fremen, cujo próprio nome não disfarça o fato deles serem o povo rebelde que precisa ser libertado do jugo do imperador (Free men — homens livres. É, Frank Hebert não se esforçou muito nesse nome). Tudo isso acontece mais ou menos da mesma forma nos dois filmes, mas de novo, tudo agora é muito mais grandioso, majestoso, épico. Não é à toa que alguns críticos estão falando que este é o “Senhor dos Anéis” de nosso tempo. Os cenários são incríveis, as naves são incríveis, tudo é pensado nos mínimos detalhes, temos um portal no espaço gigantesco por onde passam as naves que é simplesmente sensacional, tudo remetendo a sci-fi puro mesmo. E claro, os vermes da areia que são as grandes estrelas da história toda.

No original, tínhamos grandes efeitos especiais, mas uma execução falha. E mesmo no quesito efeitos, ainda ficava atrás, claro, do grande marco da época, os filmes de um certo George Lucas. O que é irônico, já que Duna foi uma das inspirações para Star Wars (ou você achava que a ideia de um Imperador cruel dominando a galáxia era original?). Agora, no entanto, a situação se inverte, temos efeitos ainda mais magistrais que os filmes mais novos da saga dos jedi, com uma execução competentíssima, que nos deixa esperando por mais.

Um grande acerto é fugir da fórmula Marvel, que tem influenciado a grande maioria dos filmes hoje em dia, de ficar fazendo piadinhas a cada 5 minutos e ter ação desenfreada só pra agradar fanboy. Não, dá pra ver que Denis Villeneuve ama Duna e preocupou-se em manter-se fiel ao cerne do livro, custe o que custar. E se vai levar 10 filmes para ele contar a história toda, que seja.

É claro, jamais saberemos como teria sido o Duna de Jodorowsky. Mas isso é outra história.

Texto original: Duna (1984) x Duna (2021) — Quadrinhópole (quadrinhopole.com)

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